Amigos e leitores,
Se você já passou algum tempo em círculos cristãos, especialmente na internet, provavelmente já se deparou com a grande batalha, o clássico do futebol teológico: Calvinismo versus Arminianismo.
Parece que existem dois times, com camisas bem definidas, torcidas apaixonadas e uma pressão constante para que a gente escolha um lado. De um lado, a soberania total de Deus. Do outro, a defesa do livre-arbítrio. E a gente fica no meio, muitas vezes, sentindo que nenhuma das duas camisas nos serve perfeitamente.
Mas... e se eu te dissesse que o cristianismo é muito maior que esse campo de futebol? E se essa não for a única conversa possível? A verdade é que a Igreja de Cristo, em seus dois mil anos de história, pensou sobre a salvação de formas muito mais ricas e diversas.
Hoje, quero te convidar a espiar para fora desse debate e conhecer outros jeitos que nossos irmãos, em outras tradições, encontraram para pensar o tema da eleição de Deus e sobre Sua graça.
As terceiras vias da história
O caminho Luterano: A perspectiva Luterana nos oferece uma perspectiva curiosa. É a perspectiva que concordo. Concordamos com os calvinistas que, por causa do pecado, nossa vontade é “escrava” e não podemos escolher a Deus por nós mesmos. A salvação começa e termina em Deus. Mas, ao mesmo tempo, não afirmamos que Deus predestina alguns para a perdição. Para nós luteranos, a salvação é sempre obra de Deus, mas a condenação é responsabilidade de quem resiste à Sua graça. Como isso funciona exatamente? Convidamos todos a abraçarem o mistério, ao invés de tentar encaixar Deus em um sistema perfeito.
A dança da Ortodoxia e do Catolicismo: As tradições mais antigas da Igreja, como a Católica Romana e a Ortodoxa Oriental, nos ensinam a conviver com a tensão. Para eles, a salvação é como uma dança. Deus, em Sua graça, sempre dá o primeiro passo e estende a mão. E nós, com nossa vontade livre (que está ferida pelo pecado, mas não morta), respondemos a esse convite. Deus inicia, nós cooperamos. É uma sinergia, um “trabalhar junto” com Deus ao longo de toda a vida.
E se a chave estiver no conhecimento de Deus?
Mais recentemente, alguns pensadores tentaram resolver o dilema focando não na nossa escolha, mas na forma como Deus conhece o tempo.
O xadrez do Molinismo: Imagine um grande mestre de xadrez (Deus) jogando contra um iniciante (nós). O mestre conhece todos os movimentos possíveis que o iniciante poderia fazer em resposta a qualquer jogada sua. Sabendo disso de antemão, o mestre faz a jogada inicial que, não importa o que o iniciante escolha livremente, o levará ao resultado que o mestre planejou. Para os molinistas, Deus, usando seu “conhecimento do meio”, escolheu criar um mundo onde nossos livres-arbítrios cumprem perfeitamente Seus bons propósitos, sem que Ele precise nos forçar a nada.
O futuro aberto do Teísmo Aberto: E há uma visão mais radical, que pergunta: e se o futuro não estiver totalmente escrito? Para que nossa liberdade seja genuína, os teístas abertos dizem que Deus conhece todas as possibilidades, mas Ele não conhece as nossas escolhas antes de as fazermos. Ele descobre o futuro junto conosco, respondendo e se adaptando à história em um relacionamento dinâmico.
Por que isso importa?
Meu objetivo aqui não é te confundir mais, mas o exato oposto: te libertar.
Primeiro, nos libertar com uma dose de humildade. Perceber que irmãos e irmãs, ao longo de séculos, lendo a mesma Bíblia e amando o mesmo Cristo, chegaram a conclusões diferentes nos impede de achar que somos os donos da verdade.
Segundo, nos libertar da pressão de ter que caber em uma de duas caixinhas. A sabedoria de Deus é mais vasta que os nossos sistemas.
No fim das contas, a nossa salvação não depende da nossa capacidade de explicar perfeitamente como ela funciona. Ela depende unicamente de Quem a operou: Jesus Cristo. O “como” é um mistério fascinante para estudarmos com amor. O “Quem” é a nossa certeza e o nosso descanso.
Com carinho,
Marlon Anezi
Se esta carta abriu um pouco o seu horizonte, fico feliz! E eu adoraria saber nos comentários: qual dessas perspectivas mais te surpreendeu ou te fez pensar? Vamos conversar com graça e curiosidade.
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