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Quando a sala de aula vira um ringue

Existem notícias que nos marcam de um jeito diferente, não é? Para mim, uma delas foi a daquele aluno e professor que trocaram socos no Distrito Federal, em maio. Confesso que meu coração ficou apertado. São imagens duras, desconcertantes, e a minha primeira reação na época foi de choque, de buscar um culpado, de lamentar “onde vamos parar?”

Mas, agora, com um pouco mais de distância, percebo ainda mais claramente que aquelas cenas são, na verdade, um espelho doloroso que não falam apenas sobre duas pessoas; falam sobre todos nós.

                             

A verdade é que, por mais que a gente tente romantizar, a Bíblia é brutalmente honesta sobre a nossa condição. Ela nos mostra que a violência não é um acidente, mas um sintoma real de ruptura. Ruptura com Deus, com o próximo e até com nós mesmos. Lutero, depois Barth utilizaram e talvez Agostinho tenha sido o primeiro a cunhar uma expressão em latim que eu acho perfeita: homo incurvatus in se — o ser humano curvado sobre si mesmo, incapaz de olhar para cima ou para os lados.

Quando volto àquela briga, o que enxergo é isso. Não é apenas a quebra de uma regra escolar, mas a fratura da nossa vocação humana de cuidar, ensinar e conviver. O espaço que deveria ser de construção se torna um campo de batalha para dores que não foram tratadas e limites que falharam em ensinar.

A violência na escola revela a doença da nossa sociedade. A sala de aula apenas reflete o que nós nos tornamos. Se lá falta empatia, é porque ela também falta em nossas conversas, nas redes sociais e em nossas casas.

Na cruz, Deus olhou para a nossa violência e não respondeu com mais violência, mas com graça. Ele absorveu nosso caos para nos oferecer Sua paz.

Por isso, talvez a pergunta que precisamos responder, pensando teologicamente, não seja “como resolver o problema da escola?”, mas sim “o que essa realidade diz sobre mim?” O convite do Evangelho é para que a gente pare de terceirizar a culpa e comece a ser a resposta. “Bem-aventurados os pacificadores”, disse Jesus, “porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5.9).

Talvez eu e você precisemos ser os pacificadores em nosso metro quadrado. Na forma como educamos, como tratamos as pessoas online, como oramos por nossos alunos, professores e jovens. A cura não virá de um grande programa governamental, mas de corações transformados, um de cada vez.

Afinal, esse não é um problema apenas pedagógico. É, acima de tudo, espiritual. E a resposta definitiva está n’Aquele que prometeu transformar nossos corações de pedra em corações de carne.

Que Ele nos dê sabedoria para, em meio ao caos, sermos nós os portadores da Sua paz.

Com um abraço,

Marlon Anezi

Se esta reflexão tocou seu coração, salve para ler depois ou compartilhe com alguém que também se preocupa com nossos dias. Como podemos, na prática, ser “pacificadores” em nosso cotidiano? Vou adorar ler sua perspectiva nos comentários.




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