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Uma vida com propósitos: o que podemos aprender com este livro?

Eu li Uma Vida com Propósitos: Para Que Estou na Terra? no ano de 2019, embora já conhecesse o livro desde 2017. Normalmente, começo a ler os livros algum tempo depois de adquiri-los, às vezes anos depois.


Antes de qualquer coisa, é importante destacar que este livro é um best-seller, um dos mais vendidos da história, de acordo com a Publishers Weekly. Diante desse fato, podemos nos perguntar: por que esse livro vendeu — e ainda vende — tanto?

Em primeiro lugar, Rick Warren é um pastor conhecido mundialmente. Ele foi o responsável pela oração na posse do presidente Barack Obama, em 2008, e é o fundador da Saddleback Church, uma igreja estabelecida em 1980 na Califórnia. A Saddleback cresceu exponencialmente e se tornou uma das maiores megachurches dos Estados Unidos, destacando-se pelo seu modelo de igreja com propósitos, que influencia igrejas ao redor do mundo. Além disso, a igreja é reconhecida por seus ministérios voltados para discipulado, missões e ações sociais, bem como por seu impacto global por meio de conferências e treinamentos. Uma de suas iniciativas mais conhecidas é o PEACE Plan, que visa mobilizar igrejas para enfrentar desafios globais.

Desde 2022, Rick Warren não é mais o líder da Saddleback, pois se aposentou, e hoje a igreja continua sua trajetória sob a liderança de Andy Wood e sua esposa, Stacie Wood.

O sucesso de vendas do livro

Além da notoriedade de seu autor, Uma Vida com Propósitos aborda um tema universal: a busca por um propósito na vida. Essa é uma questão que ressoa com praticamente qualquer pessoa, independentemente da idade, profissão ou contexto social. Perguntas como “Por que estou aqui?” e “Qual é o meu propósito na vida?” são profundas e existenciais, atraindo tanto cristãos quanto leitores em geral.

Outro fator que contribuiu para seu sucesso foi a linguagem acessível utilizada por Rick Warren. Ele escreveu o livro de forma clara, direta e prática, sem o uso de terminologias teológicas complexas. Além disso, organizou a obra em 40 capítulos curtos, para serem lidos diariamente, incentivando a leitura devocional.

O livro também foi amplamente adotado por igrejas como material de estudo para pequenos grupos, o que ajudou a impulsionar suas vendas.

Vale lembrar que o livro foi lançado em 2002, um ano após os ataques de 11 de setembro de 2001, quando muitas pessoas nos Estados Unidos e ao redor do mundo buscavam respostas espirituais e um propósito maior para a vida. Esses fatores contribuíram significativamente para sua popularidade.

O que podemos aprender com este livro?

Rick Warren ensina, por meio de seu livro, a teologia do propósito, enfatizando que todo cristão tem um propósito dado por Deus. Ele estrutura a obra em torno de cinco propósitos fundamentais, baseados na Bíblia:

  • Adoração – Fomos criados para agradar a Deus.

  • Comunhão – Fomos feitos para pertencer à família de Deus.

  • Discipulado – Fomos formados para crescer à semelhança de Cristo.

  • Ministério – Fomos moldados para servir a Deus.

  • Missão – Fomos feitos para evangelizar e cumprir a Grande Comissão.

Vamos analisar cada um desses propósitos e refletir sobre sua abordagem no livro.

Uma análise dos propósitos elencados por Warren

1. Adoração

Sim, fomos criados para glorificar a Deus em tudo o que fazemos. No entanto, Rick Warren enfatiza a ideia de que podemos agradar a Deus, o que pode levar a uma interpretação problemática. A Bíblia nos ensina que ninguém consegue agradar plenamente a Deus por meio de seus próprios esforços — apenas Jesus o fez. No entanto, como criaturas feitas para glorificá-Lo, temos o chamado de refletir, dentro de nossas limitações, Sua sabedoria, poder e bondade.

2. Comunhão

A comunhão é, de fato, essencial para a vida cristã. A vida em comunidade com o corpo de Cristo é um meio importante de glorificar a Deus. Nesse aspecto, o ensino de Warren está alinhado com a perspectiva bíblica.

3. Discipulado

Aqui encontramos um ponto delicado. O discipulado, segundo Warren, tem como propósito nos tornar mais semelhantes a Jesus. No entanto, esse processo acontece de forma mais orgânica e espiritual, sendo conduzido pelo Espírito Santo por meio da santificação.

Atualmente, muitas igrejas tratam o discipulado de maneira extremamente estruturada, como um programa de treinamento empresarial. Isso levanta a questão: quem não participa desse modelo estaria deixando de cumprir seu propósito? É necessário ter cuidado para não criar um exclusivismo dentro da fé cristã.

4. Ministério

Rick Warren apresenta uma definição de ministério que, em alguns momentos, parece opô-lo à vida comum. A visão de Warren pode dar a impressão de que servir a Deus significa abandonar os prazeres legítimos da vida e focar exclusivamente no ministério religioso.

Porém, a Bíblia ensina que Deus criou o mundo para que desfrutássemos dele. Os recursos que Ele nos deu são para todos, e a vida cotidiana também é um espaço para servir e glorificar a Deus. Trabalhar, estudar, cuidar da família e até mesmo descansar fazem parte da vida cristã. O ministério não pode ser reduzido apenas a atividades dentro da igreja.

5. Missão

A missão, para Warren, está inteiramente centrada no evangelismo, ou seja, na ação humana de levar outras pessoas a Cristo. Embora o evangelismo seja parte essencial da missão cristã, a obra missionária é, em última instância, realizada por Deus.

Rick Warren enfatiza que cada cristão tem um papel na Grande Comissão (Mateus 28:19-20). Essa visão se alinha à interpretação batista, que enfatiza o “Ide!” de Jesus como um chamado pragmático e direto. No entanto, o livro como um todo reflete um pensamento pragmático, condizente com a visão de “igreja com propósito” promovida por Warren.

Cuidado com a lista de tarefas

Além da forma como o autor conceitua cada propósito, é preciso ter cuidado com um aspecto central do livro: ele tende a transformar o propósito da criação em uma “lista de tarefas”. No entanto, podemos simplificar essa questão:

O propósito da criação é glorificar a Deus — e isso pode acontecer de diversas formas: no campo missionário, na sala de aula, recolhendo o lixo, administrando empresas, trabalhando como costureira ou realizando curativos. O servir a Deus não depende da nossa profissão e nem significa que devemos transformar todas as pessoas com quem falamos em alvos de conversão.

Sim, todos os lugares onde estamos são um campo missionário, mas a missão é realizada por Deus. Nosso maior testemunho, contudo, é o nosso exemplo e a forma como vivemos. Nosso propósito é glorificar a Deus demonstrando Sua bondade, sabedoria e poder em nossas vidas.

Não precisamos nos sentir culpados por desfrutar das bênçãos que Deus nos concede através de Sua boa criação. Em vez de transformar a missão em uma pressão constante para “fazer mais”, podemos descansar na certeza de que Deus age por meio de nós em cada detalhe da nossa caminhada.

Por Marlon Anezi

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