Em 2016, fui impactado ao ler o livro Maravilhosa Graça, de Philip Yancey. Uma obra impressionante, talvez o melhor livro sobre vida cristã que já li. Além do tema, a escrita de Yancey contribui para que a leitura seja envolvente e amplamente apreciada. Mas em que este livro me impactou, especificamente no que diz respeito ao tema?
A graça, como nós cristãos sabemos — ou deveríamos saber —, é a base da nossa salvação. Ela também é o fundamento da ética cristã. Ao mesmo tempo em que Deus nos perdoa, Ele entende que nós já perdoamos o próximo que nos ofendeu, como Jesus ensina na oração do Pai-Nosso. Ou seja, a graça não é apenas algo circunscrito à ação de Deus; se ela é a linguagem de Deus para conosco, deveria ser a linguagem com que nós, cristãos, nos comunicamos uns com os outros e com o mundo. Mas será que é assim que acontece?
Em todas as esferas da sociedade, somos levados a viver sob a lógica do mérito ou da meritocracia. Aprendemos que é preciso fazer para merecer; que quem não conquista algo é porque não merece ou não trabalha tanto quanto aquele que conquistou. Somos ensinados a recompensar quem merece e a punir quem não merece. Quem faz tudo certo é considerado digno de coisas boas; a quem não faz as coisas certas resta apenas a condenação e o juízo. Essa perspectiva pode parecer natural para todos nós, afinal, desde que nos entendemos por gente, fazemos parte de um mundo que ensina essa forma de encarar a vida.
Você poderia pensar: “Ah, mas com os cristãos é diferente; nós somos bons e misericordiosos.” Será? Será que essa é a associação que as pessoas fazem quando ouvem o nome “cristão” ou “evangélico”? Será que, ao pensarem em nós, as pessoas dizem: “Que povo bom e misericordioso!”?
O cenário atual é de polarização, tanto quanto no período em que li Maravilhosa Graça. As pessoas estão cada vez mais meritocráticas, e os cristãos não fogem à regra. Com os atuais envolvimentos e representações políticas, muitos se tornaram os reis da meritocracia, lutando contra tudo e todos em nome de Deus. Pouco se vê sobre atitudes de graça e perdão nas posturas públicas de evangélicos no cenário político. Mas não estou aqui para julgar ninguém. Acredito, porém, que a “não-graça”, como denomina Philip Yancey — ou seja, a ausência de graça no mundo —, tem se intensificado desde que seu livro foi lançado, em 1997.
Antes de ler Yancey, eu também não havia me atentado para a centralidade e a importância da graça na vida cristã e no nosso olhar para o mundo. Seria natural que nós, cristãos, fôssemos proclamadores dessa graça com as nossas vidas, em vez de propagadores da discórdia e da amargura, como tem acontecido em muitos casos. Parece que esquecemos que fomos alcançados não porque merecíamos, mas porque Deus escolheu nos amar incondicionalmente. Penso que a graça deveria ser o centro do nosso testemunho.
Em vez de disputarmos espaços de poder, deveríamos estar mais preocupados em sermos agentes da reconciliação, assim como Cristo nos reconciliou com Deus. Afinal, se cremos que fomos salvos pela graça, como podemos negar essa mesma graça aos outros?
Ler Maravilhosa Graça me fez enxergar essa contradição e me desafiou a buscar viver de forma coerente com o evangelho. No final das contas, o maior testemunho que podemos dar ao mundo não está em discursos inflamados ou em posições políticas cristianizadas, mas na maneira como vivemos e expressamos a graça de Deus em nosso dia a dia.
Por Marlon Anezi
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