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Cursar Teologia: o ponto de partida, não a linha de chegada.

A cada dia que passa, tenho a estranha sensação de que sei menos. E, acredite, isso tem sido uma das maiores graças que Deus me deu.

Olhando para trás, para o adolescente de 15 anos que eu era, essa frase seria um absurdo. Naquela época, no auge do Ensino Médio, enquanto meus amigos sonhavam com carros e carreiras lucrativas, eu só conseguia pensar em uma coisa: Teologia.

Parecia um desejo estranho, até meio solitário. Quem troca o futebol ou o videogame pelo estudo das profecias da primeira vinda de Cristo? Pois é, esse era eu. Lembro de passar horas debruçado sobre os Evangelhos, fascinado, me perguntando: “Como homens que viveram séculos antes de Jesus puderam descrever tantos detalhes sobre Ele?”

Tal inquietação me levou a devorar tudo o que eu podia, com as ferramentas que tinha: uma Bíblia e uma conexão de internet. Sozinho no meu quarto, eu já vivia a Teologia antes mesmo de sonhar com um diploma. Ali, naquele esforço amador e apaixonado, Deus já me ensinava a primeira lição: a busca por Ele começa secretamente, no lugar onde ninguém está aplaudindo.

A verdade é que, com a ousadia dos 17 anos, eu também me arrisquei a pregar e ensinar na igreja, muito antes de pisar numa sala de aula acadêmica. Eu tinha muitas certezas. E é aqui que a jornada fica interessante.

Hoje, ouço muito a frase: “todos somos teólogos”. E eu concordo. Todos nós pensamos sobre Deus, sobre a vida, sobre o propósito de tudo. Mas a minha experiência na Universidade me ensinou algo brutalmente honesto.

Ela me quebrou.

Muitas daquelas certezas, construídas com tanto esforço na adolescência, simplesmente ruíram. O curso de Teologia me desconstruiu de um jeito que eu jamais imaginei. Cada aula, cada livro, cada conversa me forçou a olhar para a minha fé não como uma fortaleza de respostas prontas, mas como uma tenda armada no deserto da dúvida.

E depois de ser quebrado, eu nunca mais consegui voltar a ser o mesmo. Graças a Deus por isso.

Eu percebi que o diploma não me tornou um teólogo melhor por acumular informações, mas por me ensinar a caminhar com as perguntas. E se eu pudesse te confessar algo ainda mais íntimo, é que esse processo nunca terminou. A graduação me quebrou pela primeira vez, mas a vida com Deus continua a me desconstruir e refazer todos os dias. O aprendizado não parou com o diploma; pelo contrário, foi ali que ele realmente começou.

               

Assim como o oleiro quebra o vaso que não saiu como Ele queria para fazer um novo, eu sinto que esta é a nossa caminhada espiritual. Somos constantemente quebrados para sermos refeitos de acordo com a boa, perfeita e agradável vontade de Deus.

Eu poderia criar uma lista de motivos racionais para ter escolhido esse caminho. Poderia falar sobre vocação, amor pela Palavra ou desejo de servir. Tudo isso é verdade, mas não é a verdade completa.

A verdade, no fundo do meu coração, é que eu não escolhi a Teologia. Foi o Espírito Santo quem a plantou em mim. Foi Ele quem sussurrou essa paixão no coração de um adolescente deslocado e o conduziu, pacientemente, por um caminho que nem sempre fazia sentido para os outros, mas que era o único caminho para mim.

Nós nem sempre entendemos os chamados de Deus. Às vezes, eles nos fazem sentir diferentes. Mas a beleza está em confiar que Aquele que nos chama é fiel para nos guiar em cada passo, mesmo quando a jornada envolve quebrar e refazer quem pensávamos que éramos.

Agradeço a Deus por ter me encontrado e me confiado essa nobre e interminável missão de aprender.

E você? Já parou para pensar nos desejos e paixões que Deus plantou no seu coração desde cedo?

Marlon Anezi

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