Pular para o conteúdo principal

As Escrituras exigem uma pausa

Querido leitor,

Quero compartilhar com você algo que, por um bom tempo, realmente me incomodou. Não chegava a ser um aperto no coração, mas uma espécie de perplexidade, quase uma frustração, ao observar a forma como, muitas vezes, falamos sobre as coisas de Deus.

Eu via — e, na verdade, ainda vejo — um único versículo, isolado de todo o seu contexto, sendo transformado em uma nova doutrina. Uma verdade absoluta. Às vezes, o fundamento para uma nova igreja. E eu ficava pensando: a Palavra de Deus não é um conjunto de frases soltas para usarmos como queremos. É uma história completa, um organismo vivo que pulsa com a revelação de Cristo.

Esse incômodo se estende para além do contexto cristão.

Eu observo figuras públicas, pessoas inteligentes e que admiro em suas áreas de atuação, falando sobre a Bíblia com uma superficialidade que, confesso, me deixava impaciente. Vejo cursos tratando as Escrituras como um objeto de estudo frio, quase ignorando que, para milhões de nós, aquelas palavras são vida. Ouvi alguns meses atrás menções de que o Apocalipse previa o fim do mundo no ano 2000, um equívoco que só revela um estereótipo criado em cima de um livro tão complexo.

E quantas vezes nós já não ouvimos a história bíblica ser chamada de "mito"? Ou a Arqueologia Bíblica ser tratada como fantasia, quando seus métodos são tão rigorosos quanto os de qualquer outra ciência histórica.

A verdade é que, quando se remove a historicidade da nossa fé, o que sobra? A nossa esperança não está firmada em fábulas, mas em um evento real: um túmulo vazio.

Toda essa reflexão me levou, com o tempo, a valorizar ainda mais a beleza da cautela. A Palavra nos ensina a "manejar bem a palavra da verdade" (2 Tm 2.15). E percebi que "manejar bem" não é só uma questão de técnica, mas de amor. Amor a Deus, que se tornou conhecido a nós, e amor ao próximo, aquele que vai nos ouvir.

Por isso, o convite que aprendi a fazer a mim mesmo, e que hoje compartilho com você, é simples: antes de compartilhar um ensino, antes de formar uma opinião, antes de falar sobre teologia, fé ou espiritualidade (a nossa ou a dos outros), vale a pena parar e perguntar: "Eu estou sendo cuidadoso com isso? Estou honrando a profundidade do que tenho em mãos?"

A nossa fé é um tesouro. Ela merece nosso cuidado, nosso estudo e, acima de tudo, nossa reverência.

Com carinho, 

Marlon Anezi

Se esta reflexão fez sentido para você, salve este post para reler ou compartilhe com alguém. E eu adoraria saber nos comentários: você também já se sentiu incomodado com a superficialidade ao tratar de temas profundos?


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Os óculos que mudam a forma como vemos o mundo

Você já tentou explicar algo da sua fé para um amigo e sentiu que ele simplesmente... não entendeu? Não por maldade, mas como se vocês estivessem falando línguas diferentes, operando em frequências distintas. O apóstolo Paulo nos ajuda a entender essa dificuldade. Ele fala de duas maneiras de perceber a realidade: a do “homem natural” e a do “homem espiritual”. O “homem natural” é aquele que opera apenas com a razão humana, com a lógica do que se pode ver, tocar e medir. Para essa perspectiva, as coisas de Deus — a cruz, a ressurreição, a graça — soam como “loucura” (1 Coríntios 2.14). Não é que a pessoa seja menos inteligente; é que ela está tentando ler um livro divino sem a ajuda do seu Autor. E aqui está a grande verdade: a Palavra de Deus precisa do seu verdadeiro Intérprete para ser compreendida. E o seu Intérprete é o próprio Autor: o Espírito Santo. Sem a Sua luz em nossa mente e em nosso coração, as Escrituras podem parecer apenas um conjunto de regras, histórias e ideias. C...

Afinal, o que é aconselhamento cristão?

Vamos ser sinceros: a expressão “aconselhamento cristão” pode ser um pouco confusa, não é mesmo? Para alguns, soa como uma conversa com o pastor. Para outros, parece uma terapia com oração no final. Há quem pense que é um estudo bíblico focado nos seus problemas. A verdade é que essa confusão é normal, porque o aconselhamento cristão se parece um pouco com tudo isso, mas não é exatamente nenhuma dessas coisas. Eu percebi que a melhor forma de entender o que ele é , é primeiro esclarecer algumas coisas que ele não é . Então, vamos pensar juntos sobre isso? 1. É a mesma coisa que o pastor faz? Sim e não. O que o seu pastor faz ao visitar um enfermo, confortar uma família enlutada ou tomar um café para saber como você está se chama “cuidado pastoral”. É um cuidado lindo, espontâneo e vital para a saúde da igreja. O aconselhamento pode ser parte desse cuidado, mas ele é mais estruturado — geralmente com hora marcada, em um lugar reservado, focado em uma questão específica. E a grande notí...

Duas lentes para ler a Bíblia com mais clareza

Você já leu um versículo que conhece desde criança e, de repente, se perguntou: “Será que estou entendendo isso direito?” Ou talvez já tenha ouvido alguém tirar uma conclusão de um texto bíblico que te fez pensar: “Nossa, eu nunca vi isso aí... de onde essa pessoa tirou isso?”                   Nessa jornada de leitura da Palavra, que é um aprendizado constante para todos nós, eu percebi que existem dois extremos muito comuns que podem nos desviar do caminho. Já observei isso em mim e em outros: de um lado, a tendência de se apegar apenas ao “preto no branco” do texto. Do outro, o impulso de “viajar” em nossas próprias ideias sobre o que a passagem poderia significar, correndo o risco de colocar nossas palavras na boca de Deus. Tudo começou a mudar quando eu entendi a importância de usar duas “lentes” para a leitura. Duas palavrinhas que parecem técnicas, mas que são incrivelmente práticas: referência e inferência . Lente 1: A Referência (...