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Deus não precisa de advogados

Esta semana, em uma conversa, ouvi uma frase que, embora dita com um tom de ironia, me deixou pensando: “Lá vem o advogado de Deus.” Havia na pergunta uma malícia sutil, a sugestão de que Deus é um cliente que precisa de uma boa defesa para ser considerado inocente. A provocação, na verdade, abriu espaço para uma reflexão importante que quero compartilhar com vocês.

                                              

A verdade, que é ao mesmo tempo simples e avassaladora, é que Deus não precisa de advogados. Ele não está no banco dos réus. Ele não é um suspeito precisando de um álibi. Ele não está em silêncio, esperando que alguém fale por Ele.

Ele simplesmente É.

Nós testemunhamos a Sua defesa na beleza complexa da criação, no nascer do sol de cada manhã. Ouvimos Sua voz na história que Ele nos revelou nas Escrituras. Sentimos Sua ação em nossas próprias vidas. Deus não é o réu no tribunal da história; Ele é o Juiz, a Testemunha e a própria Palavra.

E isso me leva a uma conclusão ainda mais humilhante: Deus também não precisa de teólogos.

Quem precisa de teólogos somos nós, as pessoas.

Nós somos seres racionais, cheios de perguntas, dúvidas e um desejo profundo, colocado por Deus em nós, de compreender melhor Aquele em quem cremos. Queremos que nossa fé faça sentido não apenas em nosso coração, mas também em nossa mente.

É aí que entra o nosso trabalho. Nós, teólogos, não “advogamos” por um Deus que precisa de defesa. O nosso papel é muito mais parecido com o de um cartógrafo, um desenhista de mapas.

Nosso trabalho não é defender Deus. É, com muito temor e tremor, estudar a revelação que Ele mesmo já nos deu — as Escrituras — para tentar traçar um mapa. Um mapa que ajude as pessoas a navegarem pela beleza, profundidade e coerência de quem Ele é. Um mapa que, mesmo sendo imperfeito por causa das nossas limitações, aponte com a maior clareza possível para o território real: o próprio Deus.

A teologia, quando é saudável, não aponta para o teólogo. Ela não coloca Deus em julgamento. Ela simplesmente se vira para as pessoas e diz, com um assombro sincero: “Olhem para Ele. Vejam como Ele é maravilhoso, como Sua Palavra é rica, como Seu plano é perfeito”.

No fim das contas, nós teólogos, não somos advogados de Deus. Somos apenas estudantes maravilhados, convidando outros a se sentarem na mesma sala de aula.

Com carinho, 

Marlon Anezi


Se esta reflexão te ajudou a ver a teologia com outros olhos, fico feliz! E eu adoraria saber nos comentários: qual imagem vinha à sua mente quando você pensava em um “teólogo”?


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