Há histórias na Bíblia que são como um abraço. A do Filho Pródigo, a da Ovelha Perdida... nelas, a graça de Deus é óbvia, quase palpável.
Mas, e a história do Dilúvio? Talvez por ser contada de forma simplificada na infância, ou pelo peso do seu tema, muitos de nós crescemos com uma percepção de um certo terror provocado por ela. A imagem que se fixa é a de um Deus irado, de fúria e juízo, e a única melodia que conseguimos ouvir é a do barulho das águas avassaladoras.
Mas, com o tempo, e com a ajuda dos apóstolos, eu comecei a perceber outra música por trás do barulho das águas. Uma melodia de paciência. Uma graça que, de tão presente, chega a ser ensurdecedora.
O apóstolo Pedro nos dá uma pista importantíssima. Ele nos conta que, durante todo o tempo em que Noé construía aquela arca imensa, Deus “esperou pacientemente” (1 Pedro 3.20). Pense nisso. O juízo não foi um ato impulsivo. Cada martelada de Noé era um eco da paciência de um Deus que estava dando tempo. Um Deus que, em Sua santidade, via a maldade humana, mas em Seu amor, retardava a consequência, na esperança do arrependimento.
E então vem a água. E aqui encontramos um dos paradoxos mais lindos da Bíblia. A mesma água que trouxe o juízo para o mundo foi o instrumento da salvação de Noé e sua família. Foi a água que ergueu a arca acima do caos, que a sustentou e a levou para um lugar de segurança.
Pedro diz que essa água é um símbolo do nosso Batismo. É uma imagem poderosa: Deus usa o próprio instrumento de morte para nos trazer vida. Ele nos salva através daquilo que deveria nos condenar.
E essa paciência de Deus se torna ainda mais radical quando a comparamos com a nossa. Nossa tendência humana é resolver problemas de forma rápida, eliminando o que nos incomoda. Nós nos livramos, descartamos, cancelamos.
Deus, não. Diante do “problema” de uma humanidade rebelde e pecadora, Ele não nos aniquila. Ele espera. Ele nos sustenta, mesmo em nossa falha, e nos oferece a esperança da salvação.
De Moisés a Davi, do profeta Jeremias ao apóstolo Pedro, o testemunho das Escrituras é o mesmo:
“O Senhor não demora em cumprir a sua promessa... Pelo contrário, ele é paciente com vocês, não querendo que ninguém pereça, mas que todos cheguem ao arrependimento.” (2 Pedro 3.9)
“Graças ao grande amor do Senhor é que não somos consumidos, pois as suas misericórdias são inesgotáveis. Renovam-se cada manhã; grande é a sua fidelidade!” (Lamentações 3.22-23)
No fim das contas, a história do Dilúvio não é, primariamente, sobre a água. É sobre o coração de Deus. Sim, é uma história terrível sobre as consequências do pecado. Mas é uma história ainda mais avassaladora sobre a paciência de um Deus que, em meio ao juízo, provê uma arca, fecha a porta pelo lado de fora e espera.
O mesmo Deus que esperou por aquela geração é o Deus que, com a mesma paciência, espera por nós hoje.
Com carinho,
Marlon Anezi
Se esta reflexão te ajudou a ver a história de Noé com outros olhos, salve-a. E me conte nos comentários: em qual outra história “difícil” da Bíblia você tem aprendido a enxergar a graça paciente de Deus?
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