Com certeza, o aconselhamento é uma das partes que mais gosto na Teologia, pois nos direciona para a vida prática e, assim como a teologia e o evangelho, contribuirá com a vida comum das pessoas. Nem todo mundo conhece os efeitos do aconselhamento na vida. Algumas das grandes barreiras que nos impedem de experimentar esses efeitos podem ser o orgulho, a autossuficiência, a timidez, o medo do julgamento alheio e até mesmo a preguiça. Há ainda algumas outras questões, como a falta de conselheiros realmente capacitados para o aconselhamento cristão, o medo de que o conselheiro realize alguma espécie de doutrinação, enfim.
Lidar com os problemas alheios é
também um desafio para o conselheiro, pois este também possui suas dificuldades
e não pode, por um só instante, esquecer-se que depende de Deus para vencê-las.
Ou seja, o conselheiro não é alguém sem problemas e nem um super-homem; ele é
um ser humano como o aconselhando, enfrenta batalhas diariamente e não
necessariamente vence todas; ele também erra, peca e se engana. Portanto, ser
conselheiro é também pisar em ovos; é preciso humildade para lidar com a alma
humana. Quando trata-se então de espiritualidade e religiosidade, o cuidado
deve ser redobrado, pois as questões morais que nos atravessam são muitas: as
culpas, os medos, as preocupações geradas no coração humano em nome da fé são
diversos e precisam ser de alguma forma tratados com cuidado, pois dificilmente
conseguiremos separar a moralidade do ser humano e desvinculá-lo totalmente de
julgamentos, sobre si próprio e sobre o próprio conselheiro que entra em uma
relação de transferência com este aconselhando.
Entretanto, este exercício
constante de tentar fazer o aconselhando esquecer-se da moralidade, mesmo que
por alguns momentos ao longo do aconselhamento, para que possa revelar de fato
o que está sentindo, é extremamente necessário. Quando está cheia de defesas, a
alma não se revela e, se ela não se revela, não conseguirá ser ajudada. Não
estou defendendo uma vida sem moralidade, nem que ela não faça parte do
aconselhamento, mas sim que há momentos em que o aconselhando precisa
esquecê-la para conseguir libertar o que realmente sente e receber a
intervenção do conselheiro.
Claro, tudo isso acontece como um
processo de confiança que vai sendo estabelecido aos poucos. As pessoas não se
abrem com quem não confiam, então o processo de aconselhamento deve procurar
evoluir nesse sentido, de tornar-se um porto seguro para que o aconselhando
derrame seu coração e consiga realmente aproveitar os benefícios do
aconselhamento. Na psicoterapia, chamamos esta relação de vínculo terapêutico,
o que não deixa de fazer parte da relação conselheiro-aconselhando. Aconselhar
é um ato de amor; só quem decidiu amar outro cristão através da sua vida pode
gerar fruto em sua vida através do aconselhamento. Não é algo que pode ser
feito de qualquer jeito; vidas são importantes e as decisões que as pessoas
tomam também. O aconselhamento influencia vidas e decisões, influencia
indivíduos e famílias. Algo que é dito no aconselhamento pode ocasionar uma
virada de chave em uma pessoa, em uma família, ou ainda, em uma escola, em uma
igreja, em uma empresa, em um bairro, em uma cidade, em um país.
Mas esta questão da influência
não é assim com qualquer conversa? Não. Pois o aconselhamento é um momento
destinado a pensar sobre como estamos vivendo nossa vida, sobre como temos
exercido a nossa fé e sobre nossas atitudes. Portanto, este é o momento em que
nosso corpo está mais preparado para falar, ouvir e receber influência por
parte de outra pessoa, neste caso o conselheiro bíblico. Conversas também mudam
perspectivas e decisões, mas o aconselhamento é mais do que uma conversa; é um
momento de abertura e compromisso em que o aconselhando terá que estar aberto à
influência do conselheiro e terá que se comprometer a seguir as orientações
propostas, ou ainda, no caso de não haver orientações, de continuar o processo
de aconselhamento mantendo-se aberto à intervenção do conselheiro.
Diante de todas essas reflexões feitas neste texto, como responder à pergunta: por que falar sobre aconselhamento? Primeiramente, porque ele aplica à vida cotidiana a teologia e isso é extremamente relevante. Secundariamente, porque o evangelho precisa estar em contato com a vida prática humana, ou seja, não ficar circunscrito aos momentos de culto comunitário ou de leitura devocional. A vida é o nosso culto; portanto, a fé cristã precisa participar de nossas vidas. Em terceiro lugar, porque muitas pessoas aconselham sem a noção devida do que estão fazendo, cometem erros crassos que poderiam ser, com toda certeza, evitados caso tivessem antes se capacitado. Em quarto lugar, em Cl 3.16, o apóstolo Paulo inspirado por Deus recomenda a prática do aconselhamento entre os irmãos na fé, ou seja, o aconselhamento é uma prática bíblica e que precisa continuar sendo exercida em todos os tempos e eras da Igreja Cristã. Em quinto lugar, o aconselhamento muda as pessoas e as pessoas mudam o mundo. Neste sentido, o aconselhamento faz o caminho inverso do anúncio público, da palestra, da pregação, da postagem nas redes sociais etc. Estes têm a intenção de através de uma comunicação atingir muitas pessoas. Gasta-se um espaço curto de tempo para falar a muitos. No aconselhamento, é o contrário, gasta-se o mesmo período, talvez, para atingir uma pessoa. Mas essa uma pessoa será impactada de uma forma bem diferente da multidão que ouviu algo genérico; o que é dito no aconselhamento é dito para aquela uma pessoa, no caso de um aconselhamento em família, é dito para aquela uma família. Portanto, é algo que vai direto ao ponto na situação que estão vivenciando em suas vidas. O pregador que não aconselha e não está por dentro da vida comunitária fará um sermão provavelmente genérico, falará sobre assuntos que não são relevantes para a comunidade.
Portanto, aconselhar é gerar transformação nas pessoas de forma paciente e efetiva, porque não se muda o mundo todo de uma vez só; é de coração em coração, de mente em mente que Cristo vai fazendo a Sua obra no mundo. Espero que tenham ficado claros os motivos pelos quais estamos abrindo este canal de comunicação em relação à área de aconselhamento cristão. Poderia elencar ainda outros motivos, mas penso que estes já estão de bom tamanho.
Por Marlon Anezi
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