No fundo do meu coração, a minha vontade é gritar um sonoro “sim!”. Quem não gostaria de acreditar que, no final, todos, sem exceção, encontrarão a graça e a salvação?
Lembrei disso há um tempo, ao assistir a um filme da Netflix chamado “A Caminho da Fé”. Ele conta a história real de um pastor, Carlton Pearson, que, ao se deparar com as notícias do genocídio em Ruanda, entrou em uma crise profunda. A angústia dele era palpável: como um Deus de amor poderia condenar ao inferno milhares de pessoas que sofreram tanto e morreram sem nunca terem ouvido falar de Jesus?
A pergunta daquele pastor ecoou dentro de mim, porque ela toca numa ferida que todos nós, em algum momento, sentimos. Ninguém gosta de falar sobre o inferno. E, para ser honesto, com razão. Por muito tempo, usamos essa palavra e a ideia de condenação de uma forma leviana, às vezes até cruel. Hoje, muitos de nós creio que somos mais sensíveis, questionamos mais, e isso é bom.
Mas essa sensibilidade não anula a pergunta. E eu sinto que preciso, com humildade, olhar para o que a Palavra de Deus nos diz sobre isso. Será que a Bíblia realmente abre espaço para a ideia de que todos, indistintamente, serão salvos?
O coração da gente se apega a versículos como o de 1 Timóteo 2.4, que diz que Deus “deseja que todas as pessoas sejam salvas e cheguem ao pleno conhecimento da verdade”. E que bom que Ele deseja! Isso revela o Seu coração de Pai, um coração que não tem prazer na perdição de ninguém.
O que eu precisei aprender, no entanto, é que o desejo de Deus e a realidade do mundo caído nem sempre coincidem. Deus deseja que todos conheçam a verdade, mas a realidade é que muitos morrem sem conhecê-la. E, mais importante, o que eu vejo nas Escrituras é que o amor de Deus não é uma força que se impõe. Ele nos deu a dignidade da escolha, o livre-arbítrio, e Ele respeita essa nossa liberdade, mesmo quando nossa escolha O entristece.
E então, eu me deparo com as palavras do próprio Jesus, e elas são desafiadoras:
“Entrem pela porta estreita, pois larga é a porta e amplo o caminho que leva à perdição, e são muitos os que entram por ela. Como é estreita a porta e apertado o caminho que leva à vida! São poucos os que a encontram.” (Mateus 7.13-14)
Essas palavras me confrontam. Jesus fala de dois caminhos, dois destinos, e de uma escolha. Ele mesmo se apresenta como essa porta estreita. A salvação, na Bíblia, não é um destino inevitável para todos, mas um resgate disponível a todos através de um caminho específico: a fé em Cristo, confessando que Ele é o Senhor (Romanos 10.9).
A Bíblia não me dá outra rota.
Então, como ficam as perguntas difíceis? E aqueles que nunca ouviram? A verdade é que eu não tenho todas as respostas. Acredito que a salvação, em última instância, é um mistério que pertence a Deus. A Palavra me dá pistas de que Deus é justo e “não leva em conta os tempos de ignorância” (Atos 17.30). Eu preciso descansar no caráter d'Ele, crendo que o Juiz de toda a terra fará o que é certo.
O que a Bíblia deixa claro para mim é o seguinte: a razão pela qual alguém pode não ser salvo não é porque o sacrifício de Cristo foi pequeno — pois Ele morreu por todos (2 Coríntios 5.15) — nem porque Deus é um tirano cósmico. A única causa que as Escrituras apontam é a rejeição do resgate oferecido. É ter o conhecimento da porta estreita e, ainda assim, preferir o caminho largo.
Isso muda o foco. A questão deixa de ser “quem Deus vai excluir?” e passa a ser “como eu vou responder a esse convite de amor?” A intenção de Deus, revelada em Jesus, nunca foi condenar, mas “buscar e salvar o que estava perdido” (Lucas 19.10).
A porta pode ser estreita, mas ela está aberta. E Ele está do lado de dentro, nos esperando.
Com carinho e em oração,
Marlon Anezi
Este é um tema sensível e profundo. Se esta reflexão te ajudou a organizar os pensamentos, salve-a para reler. E eu adoraria saber, com todo o respeito, nos comentários: como você lida com essa tensão entre o amor universal de Deus e o chamado específico de Cristo?
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