Eu preciso te contar uma coisa que aconteceu em 2014 e que nunca mais saiu da minha cabeça. Eu participava do ministério de louvor da igreja que eu frequentava e, um dia, sugeri um hino que dizia: “Cordeiro que foi morto, mas hoje vivo está...”. Para mim, era a essência da nossa fé.
Pouco tempo depois, descobri que a música tinha sido retirada da lista. A justificativa? A expressão “cordeiro que foi morto” soava muito “pesada” para uma das integrantes. Naquele momento, trocamos por outra canção, uma que soava mais leve, mais palatável.
Aquilo me marcou. Não por julgar a pessoa, mas porque eu reconheci ali, de forma muito clara, um sentimento que mora em todos nós: um profundo desconforto com a dor, com o sacrifício, com a cruz.
A verdade é que, se a gente for sincero, o nosso instinto natural é sempre fugir do sofrimento. E, sem perceber, nós projetamos esse desejo na nossa fé. Queremos um evangelho mais leve, um Jesus vitorioso, mas sem as feridas. Um rei no trono, mas sem o cordeiro no matadouro.
E essa não é uma tentação nova.
No auge da agonia de Cristo, a multidão gritava exatamente isso: “Salva-te a ti mesmo, e desce da cruz!” (Marcos 15.30).
Essa frase é o hino do nosso coração caído. Um dos ladrões ao lado de Jesus repetiu o mesmo refrão. Até mesmo Pedro, o amigo fiel, tentou impedir Jesus de ir para a cruz, dizendo que aquilo jamais lhe aconteceria (Mateus 16.22). O evangelho no coração de Pedro, naquele momento, era um evangelho de autoproteção, de evitar a dor a todo custo.
É o evangelho que nós, instintivamente, preferimos.
Quantas vezes, em meus pensamentos, eu não peço indiretamente a mesma coisa? “Senhor, me tira dessa situação. Me salva desse sofrimento. Me faz descer desta cruz”. Mal sabia o ladrão, e mal sabemos nós, que a salvação não estava em descer da cruz. A salvação era a cruz.
O que eu precisei entender, e ainda estou aprendendo, é que Jesus não estava na cruz porque era fraco, mas porque nos amava. O amor do Pai por nós O manteve ali. Ele não precisava ser salvo; Ele é a Salvação. Descer da cruz seria salvar Sua vida temporariamente para nos perder para sempre.
E aqui está o paradoxo que vira o nosso mundo de cabeça para baixo: na fé cristã, descer da cruz é perder a vida. Permanecer nela, abraçá-la, morrer nela... é encontrar a vida verdadeira.
Jesus nunca nos ofereceu um caminho fácil. Pelo contrário, Ele disse: “tome a sua cruz e siga-me”. A mensagem da cruz sempre foi um escândalo. E talvez o nosso erro hoje seja tentar torná-la menos escandalosa, mais agradável.
Mas não podemos ignorar a maior demonstração de amor da história só porque ela nos causa desconforto. Fomos chamados para encontrar a vida exatamente onde o mundo só enxerga a morte. Somos convidados a descobrir a alegria em meio ao sofrimento, a fé no meio da tempestade e a vida que brota da cruz.
Não é fácil. Eu sei que não é. Mas a beleza é que não precisamos fazer isso sozinhos. Aquele que permaneceu na cruz por nós, hoje caminha ao nosso lado, nos dando a força necessária para carregar a nossa.
Com carinho,
Marlon Anezi
Se esta reflexão te desafiou de alguma forma, salve-a para ler novamente. E eu gostaria muito de ler sua opinião nos comentários: de que maneira você acha que nós, como igreja, tentamos “amaciar” a mensagem da cruz em nossos dias?
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