
E é exatamente nesse lugar de conforto que as palavras de Jesus em Mateus 23 me encontram e viram a minha mesa.
Ele olha para os religiosos de sua época, homens que eram impecáveis em suas práticas mensuráveis — eles davam o dízimo de cada erva da sua horta, da hortelã, do endro e do cominho — e faz uma acusação devastadora: vocês fazem tudo isso, mas se esqueceram do mais importante. Esqueceram da justiça, da misericórdia e da fé.
Eles eram mestres na ética quantificável, mas reprovavam no que não se pode medir.
E eu me pergunto: será que nós também não caímos na mesma armadilha?
É muito mais fácil ser “religioso” do que ser verdadeiramente espiritual. Ser religioso é separar 10% das nossas finanças e sentir que os outros 90% são nossos para gastar como quisermos. Ser espiritual é entender que 100% dos nossos recursos vêm de Deus e devem ser administrados com sabedoria para a Sua causa — que inclui, sim, a igreja, mas também o sustento da nossa família, o cuidado com o pobre e a generosidade em todas as áreas.
Ser religioso é guardar o domingo para Deus e viver o resto da semana para nós mesmos. Ser espiritual é buscar a vontade de Deus em todos os dias, descansando em Cristo em todo tempo.
Nós criamos dosagens que nos dão a impressão de uma vida cristã saudável: um batismo (feito), participei da Santa Ceia (feito), o culto semanal (feito). E com a nossa lista marcada, passamos os dias com a consciência tranquila, livres para não pensar nos problemas dos outros, imunes à prática da misericórdia.
Eu imagino Deus olhando para a nossa lista de “deveres cumpridos” e perguntando com amor:
“Isso é importante, e sou grato. Mas e as coisas que não se podem contar? Onde Eu estou nelas? Onde Eu estou na sua segunda-feira de manhã, no meio do estresse do trabalho? Onde Eu estou na forma como você usa os outros 90% do seu dinheiro? Onde Eu estou na conversa que você tem quando ninguém da igreja está olhando?”
A solução que o Evangelho nos oferece não é criar mais regras ou aumentar as porcentagens. Não é trocar as ofertas de 10% por ofertas de 100%. A solução é uma nova consciência.
Uma consciência que não é mais guiada por uma obediência externa, por medo ou por obrigação, mas que nasce de dentro para fora, pelo poder do Espírito Santo que habita em nós. Quando entendemos que a vida inteira é o nosso culto, a pergunta deixa de ser “O que eu preciso fazer para Deus hoje?” e se torna “Como posso honrar a Deus em tudo o que eu fizer hoje?”
Não se trata mais de cumprir um papel, mas de viver um relacionamento. Um relacionamento real, que transborda do domingo para a semana, dos 10% para os 100%, do banco da igreja para cada canto da nossa existência, até que Cristo, de fato, reine sobre todo o nosso ser.
Com carinho,
Marlon Anezi
Se esta reflexão te desafiou, salve-a para ler novamente. E eu te convido a pensar com honestidade: em qual área da sua vida você tem se apoiado em uma “fé de caixinhas”? O que significaria convidar Jesus para os outros 90%?
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